Consequências da iliteracia sobre a Morte
- Doulas do Fim da Vida

- 29 de jul.
- 2 min de leitura
Trabalhar em Cuidados Paliativos pode ser muito desafiante. Principalmente em internamento. Muitos, na sua iliteracia experiencial deste tipo de filosofia de vida e acompanhamentos, podem comentar que é pela morte em si mesma. Que é pesado porque acompanho na fase final da vida (sejam anos, semanas, dias). Dizem isto porque, infelizmente, culturalmente, socialmente, associamos a morte a um fardo pesado. Uma Montanha de sofrimento que, apesar de estar visível para que qualquer um de nós a possamos vislumbrar (por isso uso propositadamente o termo montanha e não uma caverna) nunca é falada. É coberta de um manto de fuga, dissociação coletiva, luta sanguinária emocional que depois se repercute, literalmente, na forma como acompanhamos quem amamos. Lutamos para que quem “amamos” fique quando a alma já não cabe mais no seu corpo. Atacamos quem tenta se intrometer no nosso caminho e cegueira de dor. Dissociamos e fingimos que nada se passa. Recusamos escutar as palavras “vai morrer”, está a morrer”, “está na sua fase final de vida”, na esperança de que se não ouvirmos nada se materializa. Vivemos numa presença ausente. Isto tem repercussões no luto, individual e coletivamente.
A Montanha está mesmo à nossa frente. Todos os dias acordamos, saímos da nossa cama, abrimos a janela do quarto e ela está ali. Majestosa. E nós não a vemos.

Trabalhar em Cuidados Paliativos pode ser muito desafiante porque a sociedade, a nossa cultura, o sistema de saúde e educativo, as famílias, os amigos, os conhecidos de quem está a morrer, podem carregar no seu sistema nervoso formas de presença que são sinónimos de cenários de guerra. E isto repercute-se no meu sistema nervoso que recebe esta informação. É cansativo presenciar e sentir constantemente estas lutas, a cegueira, a ignorância.
A Morte não é sinónimo de Guerra. É o oposto.
Chegar ao pico da Montanha da nossa Vida, seja qual o tempo da sua existência aqui neste plano material, é um caminho comum a todos nós. Podemos ficar adormecidos e inconscientes para esta Verdade Cósmica da Vida e isso tem as suas consequências. Escolhemos não nos nutrir e aprender as ferramentas fundamentais para podermos subir a Montanha. Quem escolhemos que suba connosco? Quem nos ajudará nas dificuldades, nas entorses da vida? Quando queremos desistir? Quando queremos descansar? Quem nos ama ao ponto de nos fazer crescer, aprender, ensinar, permitir transformar na nossa nova e melhor versão, a cada momento? Quem nos permite ser livres para sairmos do nosso casulo, permitindo-nos fazer crescer os músculos emocionais, físicos, espirituais, relacionais da resiliência? Quem nos Ama para sermos Livres para ir ao encontro de Deus noutro plano que não este e nos sabe acompanhar fisicamente, emocionalmente, espiritualmente nesta viagem?

Sentir a ausência de Amor cansa. Porque mais do que dizer que amamos é fundamental sabermos Amar. E a Compaixão anda sempre aliada à sabedoria. A maior parte de nós é ainda apenas uma criança muito pequena, diria até que acabada de nascer, e que não quer crescer. Somos adultos que agem como crianças pequenas que se recusam a olhar a realidade da Vida e a fazer parte dela.




Comentários